O que estou lendo – Contos de Kolimá de Varlam Chalamóv
Desde muito jovem, após ler Crime e Castigo de Dostoiévski, me tornei um grande admirador da literatura russa.
É inegável o enorme talento de tantos escritores lendários russos, muitos dos quais ainda desconhecidos do ocidente e na própria Rússia, devido à censura e cancelamento por motivos políticos durante a ditadura soviética.
Infelizmente um país com um histórico continuo de totalitarismo, que permanece até os dias de hoje como podemos atestar após a recente invasão da Ucrânia, que vem consistentemente esmagando e suprimindo as manifestações culturais de seu povo.
Os seis livros desta série de Varlam Chalamóv narram suas experiências de inaudita brutalidade em quase 20 anos de prisão durante o regime comunista comandado por Joseph Stalin, e deveriam ser leitura obrigatória para todos aqueles que em algum momento de suas vidas já simpatizaram com o projeto socialista.
Preso pela primeira vez em 1929 por difundir cópias da carta de Lenin endereçada aos membros do Comitê Central do Partido Comunista com objetivo de alertá-los contra as tendências monopolistas de Stalin.
Considerado um elemento socialmente perigoso, Chalamóv foi condenado por atividade contra-revolucionária, neste primeiro momento a apenas 3 anos de prisão, tendo em vista que o nível de terror stalinista ainda não havia chegado ao seu auge, caso contrário certamente teria sido fuzilado.
Pouco após ser solto, no auge da repressão, foi novamente alvo do regime soviético. Condenado por crimes políticos, passou mais 17 anos, detido ou em trabalhos forçados, a maior parte do tempo na região de Kolimá no extremo leste da Sibéria.
Seus contos auto-biográficos relatam a realidade nua e crua do gulag. Os horrores da época de Stalin são descritos de maneira direta, precisa e sem floreios, revelando toda sua aterradora e impactante brutalidade.
Valaram Chalamóv define sua literatura como um “… documento de memória, emocionalmente marcado com alma e sangue, onde tudo é documentado… um tapa na cara do stalinismo…”
Como toda bofetada curta e sonora, seus contos são concisos e objetivos, sem sentimentalismo, sem excessos retóricos, indo sempre direto ao ponto, uma simplicidade que acentua, em simultâneo, uma realidade profunda e visceral.
Uma epopeia que representa sem dúvida o mais importante testemunho de uma tragédia e um fenômeno sem igual na literatura russa.
A cada conto lido, uma atmosfera vai se adensando, e nos possibilita experimentar, embora em um nível muito menos doloroso, toda a indiferença diante da vida e da morte gerada pela necessidade de sobreviver em condições extremas, poupar energia e seguir lutando quando tudo o mais deveria fazer desistir.
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Livro: Contos de Kolimá - Valaram Chalamóv - Editora 34.
Tradução de Denise Sales e Elena Vasillevich.
Apresentação de Boris Schnaiderman Prefácio de Irina P. Sirotínskaia.
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Imagens: 1) Kolyma, Sibéria. – Fotografia do álbum Gulag de Tomasz Kizny.
2) Valaram Chalamóv preso em 1929 e 3) capa do livro.
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Leia este artigo em Inglês: peakd.com/@canellov
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